Alunos da rede municipal de ensino de Ilhabela estão aprendendo, por meio da contação de estórias, sobre a Congada de São Benedito, maior expressão cultural da cidade e que mescla dramatização e versos recitados para representar as origens de uma guerra entre dois reinos africanos. Ao final, o conflito acaba por reaproximar um pai do seu filho que há muito tempo pensava-se perdido.
Trazida ao arquipélago por Roldão Antônio de Jesus, escravizado vindo da África, a tradição da congada é realizada anualmente pela Associação de Congueiros de Ilhabela. Nas escolas municipais, um grupo de contadores de estórias propagam a cultura ancestral dias antes do evento e ajudam a formar as novas gerações de congueiros.
Nesta terça-feira (13), a E.M. Pref. Eurípedes da Silva Ferreira recebeu o contador de estória Adalberto Henrique da Silva Lopes, um dos responsáveis pelo projeto e atualmente o único dentre eles que é professor da rede municipal de ensino.
“Essa é uma obrigação que temos com a manutenção da congada, com a cultura do povo preto. Nós vamos às escolas sempre que convidados e para cada público nós adaptamos a estória para que seja condizente com a faixa etária. A intenção é trazer o lúdico e o aspecto histórico de como a tradição chegou até aqui. Para mim é um orgulho e um prazer e já faço esse trabalho há pelo menos 15 anos”, contou.
Para o público infantil, a estória adaptada conta que o conflito entre os dois reinos é causado por divergência entre o rei do Congo, o embaixador de Luanda e diferenças culturais. Enquanto no primeiro reino as celebrações a São Benedito são realizadas com danças, no segundo a tradição de cantar em reverência ao santo reforça o contraste entre os dois grupos.
O aluno Lorenzo Jesus de Souza, de apenas sete anos, se encantou com a apresentação e já quer fazer parte do evento. “Agora que eu vi como é já quero ser congueiro. Como faz para entrar?”, perguntou o estudante.
Participaram da encenação na E.M. Pref. Eurípedes da Silva Ferreira os alunos Arthur Juriam dos Santos, Enrico Mariano Souza Leite, Gustaco Bonifácio Santos, Lucca Freires Garcez Silva e Ravi Pinna Desimone Cárdenas Milani. Nesta semana ainda serão visitadas pelo projeto as escolas municipais Prof. José Benedito de Moraes, Iracema França Lopes Correa e Prof. José Antônio Verzegnassi.
Sobre a Congada de São Benedito
Presente em registros históricos desde 1794, a Congada movimenta as ruas do Centro Histórico com seus bailes, sons de atabaques e marimbas de madeira. É uma herança passada de geração em geração, com forte influência africana bantu. A tradição foi trazida ao município por Roldão Antônio de Jesus, escravizado vindo da África para a Fazenda Morro do Espinho, no bairro da Cocaia, por volta de 1785.
A dramatização encenada pelos congueiros narra o embate simbólico entre os cristãos, representados pelo Rei do Congo, e os mouros, do exército do Embaixador de Luanda. A estória ganha força com o drama da separação entre pai e filho durante a Batalha de Massangana. Anos depois, em meio a cantos, danças e versos recitados — as chamadas embaixadas — o filho perdido se revela e é reconhecido pelo Rei. A reconciliação é celebrada com homenagens a São Benedito, encerrando-se com a tradicional procissão.
A abertura da Congada de São Benedito tem início com o Levantamento do Mastro, que reúne os participantes em uma caminhada pelas ruas da Vila, ao som da marimba, toques dos atabaques, repicar dos sinos da Igreja Matriz e foguetório. Ao final da cerimônia, é servida o tradicional bolo e a "concertada", bebida típica feita com folhas de laranjeira e limoeiro, canela, cravo, rapadura e cachaça. Outro destaque da programação é a Ucharia, o almoço comunitário preparado pelas famílias dos congueiros e devotos de São Benedito.